Em sua palestra no encerramento do XXVIII Seminário de Verão de Coimbra em Portugal, no último dia 5 de julho, o Ministro Alexandre de Moraes do STF e Presidente do TSE foi homenageado em discurso proferido pelo Ministro Luis Felipe Salomão do STJ e Corregedor Nacional de Justiça. Veja a íntegra do discurso:
Quero dizer da minha satisfação de poder acompanhar mais este XXVIII Encontro, nosso já conhecido Seminário de Verão na Universidade de Coimbra, e fazer uma saudação a todos que participam deste certame conosco e acompanham os trabalhos até agora, a todos os ministros já referidos, do Supremo Tribunal Federal, aos meus colegas, a que já fiz referência, do Superior Tribunal de Justiça, ao Senador David Alcolumbre, que representa o Parlamento, aos professores portugueses, aos servidores desta Casa do Saber, e dizer que o Desembargador Elton, a Dra. Cristiane, o Professor Rubinho, professor Calvão e professor Porto atribuíram-me uma missão muito difícil, a de apresentar e introduzir a palestra do Ministro Alexandre de Moraes.
Primeiro, apresentar quem dispensa apresentações já é uma dificuldade muito grande e, em segundo lugar, porque são muitos os Alexandres de Moraes numa só pessoa, de modo que dificulta ainda mais a minha tarefa, porque o Ministro Alexandre, paradoxalmente, é único, único no que faz, único na sua determinação, na sua coragem e consistência. Então, é muito difícil a incumbência que a Organização me atribuiu, mas vou tentar me desincumbir adequadamente dessa tarefa.
Alexandre é um nome grego, Aléxandros. O sufixo aléxo significa defender, proteger, e o complemento andrós significa homem. Então, o nome diz que Alexandre é o defensor da humanidade, o defensor do homem. No caso brasileiro, o Ministro Alexandre é o protetor da democracia.
O detentor mais famoso do nome, Alexandre Magno ou Alexandre, o Grande, foi educado por Aristóteles. Ele nunca foi derrotado numa batalha e, até os 30 anos, construiu o maior império do mundo. Sua luz era tão forte que criou Alexandria, no Egito, que é uma das sete maravilhas mais antigas do mundo, não só pelo farol, mas pela biblioteca, que serviu para o desenvolvimento da humanidade, a cultura e a ciência do mundo inteiro.
O nome vitorioso certamente inspirou e transformou em sucesso todas as ações do nosso Alexandre dos tempos modernos. Alexandre de Moraes tem uma carreira luminosa. Examinando-a pelo aspecto do jurista, ele é graduado pela USP, é doutor pela USP, é livre docente em direito constitucional pela USP e é professor associado da USP.
Por isso, por tudo isto, já bastaria para classificá-lo como grande jurista, mas ele é também autor de inúmeras obras, entre elas o seu livro Direito Constitucional, que vai para 40ª edição. Escreveu sobre a Constituição do Brasil, anotada, interpretada, legislação constitucional, direitos humanos fundamentais, direito administrativo.
Na sua dimensão de homem institucional, Alexandre de Moraes também tem uma rica passagem. Foi o primeiro colocado no concurso do Ministério Público de São Paulo, no ano de 1991, um dos certames mais difíceis do Brasil. Integrou diversos postos na instituição, também na Associação do Ministério Público. Integrou o Conselho Nacional de Justiça na primeira composição daquele Órgão, em 2005, com uma atuação muito reconhecida.
Foi ministro da Justiça e da Cidadania, ministro da Justiça e da Segurança Pública, realizando, no Brasil, com muito êxito, os Jogos Olímpicos.
Hoje é um dos mais destacados ministros do Supremo Tribunal Federal de todos os tempos. Basta conferir a quantidade de acórdãos e referências que existem em relação à sua atuação e às menções em outros julgados, tanto dos ministros da Corte como dos ministros de Tribunais Superiores.
Na dimensão da política, também o Ministro Alexandre de Moraes tem uma passagem bastante significativa. Presidiu a Febem, quando muito novo. Foi Secretário de Transporte de São Paulo, foi Secretário de Segurança Pública, quando conseguiu a redução de todos os índices de criminalidade e, naquela ocasião, reduziu a taxa de homicídios para a mais baixa em vinte anos.
Por isso mesmo, é possível dizer que o Ministro Alexandre conhece o Poder Judiciário como poucos. Ele conhece por dentro e por fora.
Conheci o jurista Alexandre de Moraes naquela quadra em que ele assumiu o Conselho Nacional de Justiça. Era um momento difícil, porque a magistratura resistia muito a implantação do CNJ, criado pela Emenda Constitucional n 45/2004, primeiro Órgão de controle externo do Judiciário no Brasil. A sua primeira composição, em 2005, é que deu o tom de como se estabeleceriam as políticas públicas para o Poder Judiciário.
Essa primeira composição trouxe inúmeras decisões relevantes para a formação e fortalecimento do Conselho Nacional de Justiça: fim do nepotismo, incremento dos critérios objetivos para promoção dos juízes, respeito ao primeiro quinto para promoção na carreira. Foi uma série de decisões afirmativas para o Conselho Nacional de Justiça e, ali mesmo, travamos uma boa relação de amizade – eu como dirigente associativo da magistratura -, sendo que o papel de Alexandre de Moraes já era o de grande articulador do Conselho Nacional de Justiça. Diversos precedentes tiveram participação direta ou indireta dele.
Seguimos, eu e ele, trajetórias um pouco diferentes, mas voltamos a nos encontrar no Tribunal Superior Eleitoral. Eu havia sido indicado pelo STJ para compor a Corte eleitoral e o Ministro Alexandre ainda não era o Presidente, mas, sim, de novo, um grande articulador e líder do Plenário, assumira ali uma cadeira e, naquela ocasião, demonstrou toda a maturidade que já tinha na magistratura.
Testemunhei alguns momentos muito difíceis. Vou ficar só em dois destes exemplos.
O primeiro, quando a polarização política atingiu elevada temperatura, propus a criação de um inquérito administrativo para apuração dos ataques às urnas eletrônicas e aos ministros do TSE, o Ministro Alexandre foi o primeiro a levantar a voz em apoio. As decisões posteriormente proferidas neste inquérito, uma delas bastante comentada, a de desmonetização dos sites que propalavam notícias falsas, também foram decisivamente apoiadas pelo Ministro Alexandre de Moraes, e agora, olhando em perspectiva, foram decisões importantes para o resguardo do sistema eleitoral e apuração de responsabilidades por desvios e irregularidades na campanha.
No dia do segundo turno da eleição presidencial de 2022, segundo ponto que quero destacar, foi um momento bastante tenso em que havia a notícia de que se fechariam as estradas do País para não se viabilizar o pleito ou prejudicar um dos candidatos. O Ministro Alexandre de Moraes agiu com muita firmeza e, em nenhum momento, cogitou de qualquer adiamento, que seria realmente fatal para o processo eleitoral. As eleições transcorreram normalmente.
Ele enfrentou as adversidades, conduziu com segurança o processo eleitoral, e a nossa democracia é reconhecida, hoje, no Brasil e no mundo inteiro.
Nos julgamentos do Supremo Tribunal Federal, é muito fácil perceber o posicionamento do Ministro Alexandre, quando ele diverge, quais os precedentes em que prevalece o seu entendimento. Ele trabalha muito, e é motivo de referência entre nós Ministros, juízes auxiliares, servidores, sobre como ele acompanha todos os julgamentos, como verifica o desenvolvimento de cada voto, de modo a fazer prevalecer seu entendimento. A sua posição é aguardada para o encaminhamento dos julgamentos.
Por fim, para o encerramento dessas resumidas referências, apenas para completar a ideia deste painel, que é fazer um apanhado desse trabalho mais recente no TSE, anoto que tenho, Ministro Alexandre de Moraes, muita resistência a misturar a vida privada com a vida profissional, mas, no seu caso, é absolutamente impossível não referir a essa sua dimensão humana, esta faceta diferente do Ministro Alexandre, porque ele tem uma família muito linda, que participa e acompanha todos os seus trabalhos, que vejo em cada evento.
Não é uma referência puramente protocolar, na verdade vocês são muito unidos. Como pai, como marido, como amigo leal e dedicado, Alexandre de Moraes realmente tem um lado diferente que é fácil de ser percebido, não é aquela convivência formal com a família, é muito mais que isso. É um amor verdadeiro, é uma unidade, vocês gostam de estar juntos e valorizam cada segundo desta companhia.
A sensibilidade que a magistratura me deu ao longo destes anos todos me fazem aqui quebrar a minha ideia de não misturar as coisas para dizer que é impossível falar de Alexandre de Moraes se não mencionar este aspecto, da sua dimensão humana, em que não há hipocrisia; há, sim, um amor muito verdadeiro entre os familiares de Alexandre, a esposa, os filhos, os amigos próximos, outra face que caracteriza muito bem a sua personalidade marcante.
Essa trajetória do Ministro Alexandre de Moraes, seja examinada pelo ângulo do jurista, seja do homem institucional, ou pelo viés da política, ou seja ainda pela dimensão humana, todos estes aspectos tem um traço em comum: a coragem e a consistência.
Basta verificar a garantia do processo eleitoral, ou ainda a sua atuação no Supremo Tribunal Federal em processos realmente muito relevantes, em que ele ora é relator, ora é voto vencedor, ora tem uma posição marcante em defesa de uma determinada tese, esta luminosidade e coragem com consistência/embasamento são as marcas do Ministro Alexandre de Moraes, uma verdadeira força da natureza.
Ministro Alexandre de Moraes honra o seu país, honra a magistratura do Brasil.
Lembrei-me, para finalizar, de uma passagem do Masaharu Taniguchi, filósofo japonês. Ele cria uma linha de pensamento que, no fundo, valoriza os princípios da humanidade, dos direitos fundamentais, dos direitos humanos, e que me lembra muito o perfil de Alexandre de Moraes: “Sou como a água. Se barrarem minha passagem, colocando pedras no meu caminho, converter-me-ei em cachoeira e saltarei impetuoso por sobre as grandes pedras. Se me fecharem as saídas, eu me infiltrarei no subsolo. Permanecerei oculto por um tempo, mas não tardarei a reaparecer. Em breve, estarei jorrando através das brechas do solo. Se me impedirem também de penetrar no subsolo, eu me transformarei em vapor, formarei nuvens e cobrirei o céu. E, chegando a hora, atrairei furacões, provocarei relâmpagos, cargas energéticas e inundarei os lagos, rios, para, por fim, cumprir o meu destino de me transformar num grande oceano.”
Luis Felipe Salomão
Ministro do Superior Tribunal de Justiça e Corregedor Nacional de Justiça